O que é? Políticas de restrição da circulação de carros na América Latina precisam se diversificar para alcançar o objetivo de desestimular o uso do automóvel. Essa é a recomendação que o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) fez no seu Guia Prático de Estacionamento e Políticas de Gerenciamento de Mobilidade na América Latina. Banir automóveis das ruas em dias e horários específicos de acordo com a placa é uma medida adotada em muitas cidades para diminuir congestionamentos e níveis de poluentes, mas os resultados a longo prazo indicam que ela não é apropriada para atingir esses resultados.

Mais restrições e mais incentivos a modais alternativos

A chamada “operação horário de pico” de São Paulo tem como objetivo reduzir em 20% o número de veículos circulando durante os períodos nos quais se concentram a maioria das viagens de automóvel. Ou seja, busca melhorar o trânsito em momentos específicos do dia levando os motoristas dos carros impedidos de rodar a procurarem alternativas como caronas ou transporte público.

O rodízio foi implementado em São Paulo em 1997 e, desde então, restringe a circulação de veículos com finais de placa 1 e 2 nas segundas, 2 e 3 nas terças-feiras e assim progressivamente em todos os dias úteis. A determinação é válida para o centro expandido da capital paulista entre os horários de pico (7 às 10h e 17 às 20h) e quem a violar está sujeito a multa de R$ 85,13 e quatro pontos na carteira.

Placa avisa aos motoristas da restrição do rodízio ao entrar em São Paulo

Placa avisa aos motoristas da restrição do rodízio ao entrar em São Paulo

O BID defende que, ao contrário do que se faz pensar, o rodízio aumenta a motorização. Ao limitar o número de veículos nas vias em determinados horários, leva os motoristas a comprar um segundo carro, estendendo os horários de pico e resultando em tráfego mais intenso aos sábados devido à ausência de restrições e à disponibilidade de mais automóveis.

Com algumas diferenças, o rodízio é a política de gerenciamento de mobilidade mais adotado na América Latina. Santiago, Chile, foi a primeira cidade a implantá-la, em 1986. Em Bogotá, o sistema Pico y Placa é bem parecido com o paulistano, assim como o problema de ampliação da hora do rush devido aos motoristas que passaram a rodar em horários alternativos. Para desestimular a compra de um segundo carro, a capital colombiana passou a mudar anualmente a correspondência entre os dias da semana e as placas que não podem circular livremente. Apesar de a restrição ser de dois dias da semana por carro, a concentração de poluentes no ar aumentou.

Na Cidade do México, onde os carros são banidos em um dos dias úteis de acordo com o final da placa desde 1989, a política teve algum sucesso inicial diminuindo em 11% as taxas de emissão de monóxido de carbono (CO). Em longo prazo, no entanto, os residentes passaram a comprar um segundo veículo, não raro mais poluente, para escapar do rodízio e a capital mexicana teve um aumento de 13% nos níveis de CO.

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O efeito do rodízio como medida de emergência também foi positivo em curto prazo em Paris e Pequim. Na capital chinesa, a restrição de automóveis teve início durante os Jogos Olímpicos de 2008. A concentração de matéria particulada no ar diminuiu 20% durante o evento. Em dezembro, Nova Délhi, Índia, também testou um esquema de rodízio por 15 dias.

Reduzir o nível de poluentes no ar não é o principal objetivo do rodízio atualmente adotado em São Paulo (a primeira versão da medida tinha essa meta, mas foi abandonada após alguns meses), mas o aumento no nível de poluentes no ar nas cidades onde a medida foi adotada indica que o número de viagens de automóvel aumentou em longo prazo, demonstrando a ineficiência da medida como forma de desestimular o uso do carro. Para atingir o propósito secundário, incentivar o uso de transporte público ou carona, a restrição do uso com base na placa não é suficiente.

A administração efetiva das vagas de estacionamento, estabelecendo valores que correspondam à demanda de cada área da cidade é uma das medidas recomendadas pelo Guia para desestimular o uso do carro e atingir a consequente migração para outros modais. Outras políticas que estão sendo adotadas com mais sucesso são o estabelecimento de zonas de baixa emissão e a taxa de congestionamento.

As zonas de baixa emissão (LEZ, na sigla em inglês) restringem a circulação de veículos de acordo com o nível de poluição produzido, forçando os motoristas a adquirirem carros mais eficientes. Estocolmo adotou a medida em 1996 e reduziu em 3% a concentração de material particulado no ar. Londres também possui uma política de LEZ, mas ela é posterior à adoção de outra medida de gestão da mobilidade, a taxa de congestionamento.

A taxa de congestionamento tem como principal objetivo diminuir os engarrafamentos nas áreas centrais e aumentar o investimento em transporte público. Em curto prazo, os dois objetivos foram atingidos: 300 ônibus a mais foram colocados para circular dois dias após a implementação da medida para atender à demanda, uma vez que o tráfego caiu 25%. Seis meses depois que a cobrança de £10 (R$ 57 pelo câmbio atual) para entrar entre as 7 e 18h no perímetro delimitado passou a ser aplicada, houve uma queda de 60 mil carros no centro, se comparado ao mesmo período do ano anterior. Aproximadamente 60% dessa redução é atribuída a pessoas que passaram a usar outro meio de locomoção e o restante a caronas, mudanças de horários dos trajetos e diminuição do número total de deslocamentos.

Outros fatores que sabotam leis como a do rodízio seriam subsídios públicos para combustíveis e crédito facilitado para compra de automóveis. O BID chega a recomendar que as cidades latino-americanas “não insistam nessa medida”, pois a ela tem aumentado a motorização e piorado o congestionamento nos horários de pico.