O que é? O pesquisador Donald Shoup, autor do livro “The High Cost of Free Parking”, diz que 30% do tráfego de uma cidade é de gente que já chegou ao seu destino e está procurando um lugar para parar o carro. “Nossas ruas estão congestionadas, em parte, porque as pessoas ficam circulando ao redor do lugar em busca de uma vaga para estacionar”. E se a tecnologia permitisse que os motoristas utilizassem vagas ociosas, ficando menos tempo nessa ciranda e ainda dando algum dinheiro ao dono do espaço?

Airbnb das garagens

Quem costuma circular de carro pela cidade já ficou irritado enquanto procurava um lugar para estacionar. Dar várias voltas no quarteirão até encontrar uma vaga é quase rotina para os motoristas, ainda mais porque todo mundo deseja parar bem perto do seu destino. Esse tempo andando em círculos pode não parecer nada à primeira vista, mas implica em uma série de perdas para as pessoas (tempo, combustível, desgaste do carro), para o meio-ambiente (poluição) e para a cidade (congestionamento).

E se as garagens ociosas de casas, prédios e pequenos estabelecimentos comerciais que ficam ociosas durante parte do dia fossem usadas por quem precisa de um lugar para parar o carro? Essa é a ideia por trás da proposta de compartilhar estacionamento. Quem não usa a vaga que tem em casa durante o dia, por exemplo, pode alugá-la para quem trabalha por perto ou precisa parar o carro naquela região e ainda ganhar um dinheiro extra no final do mês. O gerenciamento disso é feito por meio de aplicativos que conectam o proprietário da vaga com quem tem interesse em alugá-la. É como um Airbnb dos estacionamentos.

Além de ser uma fonte de renda extra para quem aluga o espaço, esse sistema pode poupar o tempo dos motoristas. É, também, um jeito de criar novas vagas sem mexer com o que já existe na cidade e normalmente concentrado em regiões centrais. As vagas compartilhadas, por outro lado, podem estar mais espalhadas e beneficiar um público mais amplo e de diversas regiões.

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Os aplicativos EzPark, Parkingaki e Onde Parar são alguns dos que já oferecem esse tipo de serviço no Brasil. O número de vagas ainda é baixo (são cerca de 900 nos três aplicativos), a esmagadora maioria delas em São Paulo. O funcionamento de todos eles é bem parecido. O proprietário cadastra a sua garagem no sistema e quem está à procura de um lugar para estacionar será apresentado a um mapa com todas as opções disponíveis na região desejada. Normalmente, o pagamento é feito por cartão de crédito e o aplicativo fica com uma porcentagem sobre o valor negociado. Esse valor, aliás, é definido pelo proprietário da vaga, que normalmente se baseia em preços de estacionamentos próximos e tende a jogá-lo um pouco para baixo.

Além das vagas compartilhadas, os apps também apresentam um mapa com vagas em estacionamentos convencionais, para que os motoristas possam visualizar as opções disponíveis na região em que estão. Informações como horário de funcionamento, formas de pagamento, tipos de vagas e preços podem ser fornecidas pelo estabelecimento, tudo para ajudar o usuário na hora da escolha.

Estacionamento lotado

No mercado desde 2013, o Parkingaki está disponível apenas para Android e pelo website. Possui parceria com a Ingresse.com (empresa de venda de ingressos online), que envia para quem compra ingressos pelo site um aviso de que há vagas (em residências ou estacionamentos particulares) disponíveis próximas àquele evento. Dos cerca de 3 mil estacionamentos cadastrados, 250 representam vagas compartilhadas. O cadastro é gratuito e a empresa fica com 10% do valor negociado. Com relação às vagas em estacionamentos comuns, alguns oferecem a opção de reserva/pagamento pelo app. “Nós também oferecemos a possibilidade de o usuário comprar créditos e usar conforme a sua necessidade”, explica Felipe Taveira, co-fundador da empresa.

A Onde Parar está no mercado desde 2013, mas só começou a oferecer compartilhamento de vagas neste ano. “Por enquanto temos apenas duas vagas nesse sistema e a ideia é incrementar isso em breve”, diz Luis Carlos Botelho Lucas, um dos fundadores. Essas vagas, por enquanto, só podem ser negociadas via site, por onde é possível fazer a reserva e o pagamento. O app, que está disponível para iOS e Android, funciona como um mapa de estacionamentos, com a possibilidade de filtrar a busca por tipo de veículo ou a forma de pagamento aceita pelo estabelecimento. Porém, a Onde Parar não intermedeia as negociações em estacionamentos convencionais.

Disponível na AppStore e na GooglePlay, o EzPark ainda funciona em sistema beta e apresenta algumas falhas. Quando digita o endereço em que está, o usuário recebe uma lista com os estacionamentos (comuns e compartilhados) disponíveis na região. A pessoa faz a sua escolha, clica em Parar Aqui e a transação tem início. Se for uma vaga compartilhada, o proprietário vai receber uma mensagem de alerta sobre o interesse e precisa autorizar para que a transação possa continuar. Segundo Luiz Candreva, CEO da empresa, já são cerca de 630 vagas de compartilhamento cadastradas, inclusive algumas em condomínios. O app exige o valor mínimo de R$ 3 e fica com 30% do valor negociado.

Segurança

Além de ser um serviço novo, um dos gargalos desse modelo de negócios é a questão da segurança. Muita gente tem medo de disponibilizar sua vaga de garagem para um estranho, assim como muita gente tem medo de deixar seu carro na casa de um desconhecido. Os desenvolvedores acreditam que exigir dos usuários um cadastro completo – com nome, endereço, CPF, e-mail e número de celular – ajuda a dar mais segurança a quem utiliza o sistema. Os usuários precisam, também, disponibilizar um número válido de cartão de crédito e recebem uma mensagem SMS com um código de ativação. Além disso, as empresas se reservam o direito de checar a veracidade dessas informações e não aceitar o cadastro caso seja verificada alguma irregularidade. “Fazemos uma checagem dos dados e, somente depois disso, a vaga é liberada para estar no site”, explica Felipe Taveira, co-fundador do Parkingaki.

Fora as questões cadastrais, os aplicativos permitem que o dono da vaga possa avaliar o interessado  antes de dar a palavra final. “A pessoa pode analisar o perfil e conversar com o motorista antes de fechar o negócio. Se preferir, pode nem alugar a garagem para aquela pessoa”, explica Luiz Candreva, da EzPark.

Os aplicativos também apostam na avaliação feita pelos usuários dentro da plataforma. Esse sistema permite que a experiência de quem já utilizou o serviço ajude os outros usuários. Transparência e honestidade, nestes casos, fazem toda a diferença. “Um sistema transparente de avaliações estimula a confiança entre os usuários do sistema e faz uma autorregulação do serviço”, explica Sam Mellor, executivo de Relações Públicas da Just Park, site de compartilhamento de vagas que existe desde 2006 em Londres e já recebeu aporte de grandes empresas, como BMW e Index Ventures.

Uma vaga nesse estacionamento de Londres foi colocada à venda em março de 2015 por R$ 2,4 milhões em câmbio da época (Divulgação/Kingston House Parking)

Uma vaga nesse estacionamento subterrãneo de Londres foi colocada à venda em março de 2015 por R$ 2,4 milhões em câmbio da época (Divulgação/Kingston House Parking)

Em Paris, onde há uma política agressiva para desestimular o uso do carro (em 10 anos, a capital perdeu entre 50 e 60 mil vagas nas ruas), aplicativos como Zen Park e Parkadom oferecem compartilhamento de garagens e têm feito sucesso. Até mesmo uma grande rede administradora de estacionamentos – a Indigo – está fazendo sua aposta nesse tipo de serviço. A empresa lançou, em novembro de 2015, a plataforma Parking Partagé, com o objetivo de aproveitar vagas ociosas, tanto em prédios comerciais como residenciais da região metropolitana de Paris.

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O empresário Lucas Almeida já alugou uma garagem extra que tinha em seu escritório – em uma casa na Vila Mariana, em São Paulo – e diz que gostou da experiência. “No começo eu ficava preocupado com segurança, mas o fato de o aplicativo permitir um contato pessoal com quem vai alugar o espaço ajuda a diminuir essa sensação”. Sobre a renda extra, ele diz que ainda não é muito significativa porque é difícil ter alguém para ocupar a vaga todos os dias. Mas há potencial para isso acontecer. E, convenhamos, dinheiro extra não faz mal a ninguém.

Obs.: se você se interessou em cadastrar sua vaga no prédio em que mora, é importante verificar se a convenção do condomínio permite essa prática.