O compartilhamento de bicicletas existe em 11 capitais brasileiras. No entanto, o planejamento da implantação, a regulação e a transparência do serviço ainda deixam muito a desejar. Duas cidades, João Pessoa e Blumenau, já tiveram seus sistemas extintos. A integração com outras políticas de mobilidade municipais chega a fazer parte dos planos de algumas administrações municipais, mas em cidades como Belo Horizonte e Rio de Janeiro, usuários enfrentam problemas que devido à falta de manutenção básica dos serviços.

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Em João Pessoa o compartilhamento de bicicletas atendia apenas à área da praia e tinha como foco o uso turístico e de lazer. A orla da capital paraibana possui 14 quilômetros de ciclovias e contava com três estações. O sistema de bike sharing, implantado em 2010 e extinto em 2012, era operado pela Serttel, empresa recifense que opera serviço semelhante em São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Sorocaba, Salvador, Porto Alegre, Santos, Petrolina, Fortaleza, Recife, Belém, Aracaju, Brasília e Vitória.

Segundo a assessoria de imprensa da empresa, o serviço foi interrompido por falta de patrocinador. O diretor de planejamento da Superintendência Executiva de Mobilidade Urbana (Semob) de João Pessoa, Adalberto Araújo, afirma que a Serttel pediu para desativar o contrato. “As bicicletas ficaram abandonadas sem corrente, a empresa abandonou. Antes de 2012 já estava sem manutenção. Foi falta de gestão. O sistema tem que entrar dentro de um contexto que tenha a importância que merece ter, deve ser estimulado, priorizado. Se deixar cada um por si, o gestor de 2012 pensava diferente que o anterior. O transporte cicloviário tem que ter uma política, uma legislação, senão fica esse faz e desfaz”, diz. A cobrança era de R$ 15 por mês, R$ 5 pela diária ou o usuário poderia usar gratuitamente em viagens de menos de 60 minutos com intervalos de pelo menos 15 minutos entre elas.

A falta de patrocinador também é apontada pela Serttel como motivo de interrupção do serviço em Blumenau. Segundo a secretaria de comunicação social da prefeitura, o problema foi falta de usuários, mas o setor diz que não possui informações sobre o contrato porque ele foi firmado entre a empresa e o Consórcio Siga, que operava o transporte coletivo local. O sistema começou a operar em 2009 e, em 2011, a cidade anunciou planos de retomar o serviço no ano seguinte. Em janeiro, a administração municipal rompeu o contrato de concessão devido ao não cumprimento de cláusulas, resultando na dissolução do consórcio. Até o momento, o município continua sem bike sharing.

O modelo de contratação varia entre os municípios, mas eles têm um ponto em comum, a prestadora do serviço. Em São Paulo, desde que o sistema foi implantado em 2012, ele é contratado por meio de termo de cooperação (que originalmente tem a função de regulamentar a exploração da publicidade em espaços públicos por empresas que promovam obras, serviços, melhorias ou atuem na conservação desses locais). As únicas empresas a manifestarem interesse no edital de chamamento público realizado em agosto de 2015 foram Serttel, Samba e Itaú, que já operam em conjunto o sistema BikeSampa. A capital paulista conta com outro sistema de compartilhamento de bicicletas, o CicloSampa, que tem 18 estações (o BikeSampa tem 259) e também é regido por termo de cooperação entre a prefeitura e o Bradesco, mas tem foco nas ciclofaixas de lazer que são operadas pela empresa nos finais de semana.

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O site Arquitetura da Gentrificação analisou a discussão sobre a forma de contratação das duas empresas e levantou questões importantes como a exploração comercial do compartilhamento de bicicletas – uma vez que o usuário precisa pagar uma taxa se utilizar as bicicletas laranjas por mais de 60 minutos e as vermelhas por mais de 30 – não ser contemplada originalmente pelo termo de cooperação, que foi formulado para regular outras atividades.

Em João Pessoa, o serviço foi contratado via permissão do serviço público e no Rio de Janeiro por meio de licitação – a Serttel também foi a única a apresentar proposta nesse caso, segundo a assessoria da Companhia de Desenvolvimento Urbano local. As diferenças nos modelos de contratação também se refletem nos serviços prestados: apesar de serem operados pela mesma empresa o BikeRio não está integrado ao transporte público pelo sistema Rio Card (e não tem previsão para que isso aconteça), enquanto em São Paulo as estações são integradas ao Bilhete Único.

Outro problema é a falta de transparência na operação dos serviços. Quando procurada para responder sobre a arrecadação resultante do aluguel de bicicletas do BikeSampa e Ciclosampa, a assessoria da CET pediu que a questão fosse repassada para as empresas. A assessoria da Samba/Serttel afirmou que não tem acesso a esse tipo de informação. A assessoria dos operadores do Ciclosampa disse que as informações que não estão disponíveis no site da iniciativa “são confidenciais ao nosso patrocinador”. Em abril do ano passado, o Mobilize publicou um texto sobre a renovação do sistema (que tem a coordenadora de planejamento cicloviário da CET como fonte) que diz, entre outras coisas, que a “a prefeitura deseja que as informações sobre o uso do sistema, como o tipo de usuário, ou os itinerários realizados, possam ser monitorados para o planejamento de futuras ações”.

Segundo Plano de Mobilidade Urbana do Município de São Paulo, em 2015 o sistema de bicicletas compartilhadas alcançou 10% da área urbanizada da maior cidade do Brasil. O texto estabelece como meta dobrar esse índice em 2016, cobrir 60% do território até 2024 e estar disponível em 100% do município até 2028. O termo firmado com a Serttel/Samba/Itaú previa a instalação de 300 estações até 2015 e o firmado com o Bradesco, 20. No entanto, o contrato com a primeira prevê que “poderão ocorrer substituição de locais, novas instalações para ampliação do sistema e redução, na terceira etapa, do número de estações e bicicletas de acordo com a conveniência das partes”. Já o contrato com a segunda “poderão ocorrer substituição de locais ou novas instalações para ampliação do sistema de acordo com a conveniência das partes, por meio de aditamento”.