O conceito de cidades inteligentes foi uma bandeira central da passagem de Xavier Trias como prefeito de Barcelona. A capital catalã chegou a ser considerada a mais conectada do mundo, e foi onde a Cisco espalhou pequenas caixinhas metálicas capazes de medir barulho, tráfego, poluição, multidões e até mesmo o número de selfies postadas de cada rua. A administração municipal de então acreditava que o futuro da capital catalã dependia da digitalização de seus serviços públicos.

Os rumos mudaram em julho de 2015, com a eleição de Ada Colau. Em sua campanha, a nova prefeita contestava a proximidade de Trias com empresas como a Cisco e seu interesse em transformar Barcelona em um pólo tecnológico. Em apoio a uma comunidade que estava sendo despejada, ela chegou a ocupar um banco em 2013, quando foi retirada do local pela polícia. Colau prometeu aplicar multas a bancos retivessem propriedades vazias em seus registros e fazer cortes na folha salarial da administração local.

“Nós queremos uma cidade mais democrática onde os direitos humanos são respeitados como a primeira e máxima prioridade – uma cidade mais justa, igualitária e ambientalmente sustentável”, disse a prefeita em entrevista ao The Nation. Barcelona foi escolhida para sediar um evento preparatório para a conferência Habitat III, formalmente conhecida como Conferência da ONU sobre Habitação e Desenvolvimento Urbano Sustentável. Marcado para novembro de 2015, o encontro temático sobre cidades inteligentes seria abrigado pelo município que se tornou referência em “abordagens inovadoras dos desafios urbanos” e ocorreria simultaneamente ao congresso Smart City Expo.

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No entanto, apenas o Smart Cities Expo cumpriu sua agenda.  Em vez de discutir tecnologias para cidades inteligentes, o Habitat III abordou espaço público e direito à cidade. A reunião foi inicialmente vetada por Colau e passou por modificação. Ela também havia sido marcada para novembro de 2015, mas foi organizada apenas nesta semana, com mudança significativa no enfoque do debate.

No evento, a agência Habitat apresentou resultados preliminares de um estudo que indica que áreas comuns têm perdido terreno nos centros urbanos em expansão, ocupando apenas 21% da superfície total. A pesquisa analisará imagens de satélite de 200 das 4.200 cidades com mais de 100 mil habitantes pelo mundo.  Os resultados da análise também indicam que o planejamento urbano, que implica na disponibilidade dos espaços públicos, estão diretamente relacionadas com as disparidades econômicas. Enquanto na África subsaariana o planejamento alcança 10% do território urbano, nos municípios mais ricos esse índice chega a 83%.

Esse tipo de levantamento está mais próximo dos novos planos para a gestão tecnológica em Barcelona, com a prefeitura dando prioridade a questões que considera mais urgentes, como os despejos e o desemprego. Colau participou da abertura do congresso, que também contou com a presença do ex-prefeito Joan Clos, que hoje é diretor da agência Habitat. A prefeita de Barcelona defendeu que o espaço público é o principal espaço democratizador da cidade.

As conclusões da reunião devem entrar na agenda da Conferência Geral Habitat III, programada para outubro em Quito, Equador.