O que é? Kabir Mokamel desistiu de seu mestrado em belas artes na Austrália para voltar a sua terra natal, o Afeganistão, e criar um movimento que tenta mudar a forma dos afegãos verem o mundo após décadas em guerra. E faz isso valorizando o trabalhador comum, os verdadeiros heróis de Cabul.
Os lordes da arte
O Afeganistão é um país que tem a guerra como parte quase constante em sua história. Pela localização geográfica, entre o Oriente Médio e o Sul da Ásia, entre a Ásia Central e o Oceano Índico, sempre esteve no meio do caminho expansionistas de diversos impérios da história. Foi ocupado ou atacado por persas, macedônios, partas, sassânidas, mongóis, britânicos, soviéticos e americanos. Com esse currículo, era natural que a cultura local colocasse líderes militares como os grandes heróis da nação. Mas, convenhamos, os reais heróis de uma nação constantemente em guerra são as pessoas comuns, que seguem trabalhando e resistindo a tudo.
Foi isso o que pensou Kabir Mokamel, afegão criado na Austrália que fazia seu mestrado em belas artes na Universidade Nacional, em Canberra, quando decidiu voltar a seu país. Ele achou que a arte de rua deveria tomar uma posição sobre como mudar o foco da sociedade afegã. “Ao longo da história do Afeganistão, só se fala nas pessoas que lutaram, tinham espadas, tinham armas. Queremos incluir algo a mais, como as pessoas que trabalham para melhorar a cidade e nossas vidas”, comentou em entrevista à agência Associated Press. “Isso afasta as pessoas dessa mentalidade de guerra e conflito.”
Para isso, ele criou o grupo Art Lords. Ao lado de dois outros amigos, ele usa os diversos muros de Cabul como tela para seus grafites. Muitas dessas estruturas foram construídas recentemente, como forma de separar áreas do governo e a elite do resto da cidade. Com os desenhos, os artistas passam uma mensagem, ainda colorem uma cidade ainda muito abalada pelas décadas de conflitos e ainda fazem um protesto silencioso por “violar” os muros de proteção das autoridades.
Os temas são sempre trabalhadores comuns com o a frase “Os Heróis da Minha Cidade”, complementado pelo profissional retratado. No paredão ao lado do prédio do serviço secreto, por exemplo, os personagens foram os coletores de lixo. No Ministério da Educação, a mensagem foi de protesto contra a corrupção.
Para integrar mais o trabalho com a população, os integrantes dos Art Lords convidam os pedestres que passarem pelos grafites a darem sua contribuição, nem que seja com poucas pinceladas. “Houve um estranhamento inicial para o trabalho dos Art Lords. Não há uma cultura de grafite e muitas pessoas nos abordavam em inglês, achando que éramos estrangeiros”, conta. “Quando explicamos o que fazíamos, ficavam animados e dávamos brochas para nos ajudar. Muitos ficavam tímidos, mas não paravam depois que começavam. Todo tipo de gente: crianças, trabalhadores comuns, policiais, pessoas a caminho da mesquita.”
Os Art Lords não aceitam doações de governos ou instituições. O plano do grupo é cobrir mais de 50 muros por Cabul e, para isso, eles pretendem convidar grafiteiros de todas as partes do mundo para contribuírem com o trabalho, ajudando com doações ou indo ao Afeganistão para também participar das obras.