O mundo de olho no Brasil devido a um grande evento esportivo. Houve grande investimento na infraestrutura das sedes e o ritmo das obras foi intenso em diversos pontos. Avenidas, pontes, túneis e passarelas por todos os lados, mas algumas delas não duraram para ver o encerramento do tal grande evento, e ainda deixaram vítimas.
É o enredo da ciclovia Tim Maia que desabou nesta quinta, matando ao menos duas pessoas no Rio de Janeiro. Mas é possível usá-lo para falar do viaduto da avenida Dom Pedro I, em Belo Horizonte, que caiu no meio da Copa do Mundo, cinco dias antes da capital mineira ver o Brasil perder de 7 a 1 para a Alemanha,e matou duas pessoas. Também dá para aproveitar esse roteiro para a viga do monotrilho de São Paulo, que desabou na Avenida Roberto Marinho (Águas Espraiadas) e matou um operário três dias antes da capital paulista abrir a Copa.
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O caso de BH e de São Paulo entram na conta de acidente de obra, mas a tragédia carioca ocorreu com uma construção já entregue e em uso. Um uso recente: a ciclovia da avenida Niemeyer foi inaugurada em 17 de janeiro, pouco mais de três meses atrás, e não dá para dizer que estava desgastada por falta de manutenção. E não é um caso isolado. O estádio Nílton Santos, o Engenhão, recebeu os Jogos Pan-Americanos de 2007, vários jogos de futebol (é a casa do Botafogo) e está designado como sede do atletismo na Olimpíada de 2016, mas foi interditado por quase dois anos por falha na estrutura da cobertura. A vila de atletas do Pan, com apartamentos vendidos ao público após o evento, teve áreas interditadas por erros de projeto.
Esse fenômeno não é exclusivo das obras ligadas direta ou indiretamente aos grandes eventos esportivos. O Brasil tem um longo histórico de construções de infraestrutura que apresentam problemas pouco depois de inauguradas. Algo que se potencializa se há algum motivo para encurtar o prazo de entrega. E a pressa é potencialmente cruel com a boa engenharia: ela pode levar a um projeto que não contemple todas as situações possíveis, a um controle de qualidade menos apurado, a controle de segurança no trabalho mais relaxado, a uma execução com margens de segurança mais estreitas.
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É um problema crônico, e que muitas vezes é esquecido porque as autoridades têm interesse em não o atacar. Afinal, toda a dinâmica de obras públicas no Brasil entraria em xeque. Mais fácil buscar algum bode expiatório ou criar um culpado abstrato, como um fenômeno da natureza.
Um caso pequeno e pouco lembrado serve para ilustrar isso. Veja o trecho de uma reportagem da Folha de São Paulo de 12 de julho de 1997:
“Um buraco de cerca de 30 cm de comprimento por 25 cm de largura apareceu no viaduto República da Armênia, no Brooklin (zona sudoeste). A obra, que liga a avenida dos Bandeirantes à marginal Pinheiros, foi inaugurada há apenas dez meses.
A falha no concreto que recobre a pista fica junto à faixa central, no início da descida. Ela tem cerca de 15 cm de profundidade, e deixa parcialmente à mostra a estrutura de ferro da parte superior do piso.
Cerca de 20 metros adiante, no sentido da marginal, existe outro buraco com aproximadamente a mesma profundidade”.
O viaduto República da Armênia foi inaugurado às pressas no final de 1996, a tempo de ser utilizado na campanha eleitoral (Paulo Maluf era o prefeito e tentava eleger Celso Pitta como seu sucessor). Na época, a secretaria de vias públicas descartou erro na construção do viaduto. Os problemas estruturais teriam sido causados pelo tráfego pesado de caminhões.
Quem conhece São Paulo sabe que um viaduto que faz a ligação entre a avenida dos Bandeirantes e a marginal Pinheiros terá, obrigatoriamente, circulação de caminhões e veículos pesados. É a natureza desse trajeto, rota básica na ligação entre o interior e o litoral. Se um viaduto nessa área não resiste a esse tipo de tráfego, o erro não é do tráfego, mas do viaduto. Pode ser um problema de projeto ou de execução, provavelmente possibilitados por um erro de fiscalização, mas de utilização ou operação não é.
O viaduto da zona sul de São Paulo foi interditado e recuperado antes de algo mais grave acontecer. Infelizmente, não foi o caso da ciclovia da avenida Niemeyer. As primeiras informações dão conta que o mar estava de ressaca, com ondas mais altas que o normal. Algumas teriam atingido a estrutura da ciclovia, que não aguentou.
Bem, ressaca no mar carioca é um fato da natureza: ela não ocorre todo dia, mas vai ocorrer algumas vezes. Qualquer obra de infraestrutura naquela região precisa ter uma estrutura que preveja isso. A ressaca não atinge apenas uma ciclovia, como nesta quinta. Já pegou carros estacionados, como ocorreu com o roqueiro Raul Seixas nos anos 80. O mar danificou seu carro, e uma certeza ele tinha: que a culpa não era da onda.