“Quando saía de casa fazia sinal para todos os ônibus que passavam e, às vezes, para alguns caminhões também. Aí perguntava para o motorista para onde ele ia.” É assim que o programador Luiz Eduardo Porto fazia todo dia, quando precisava sair da sua casa em São Caetano do Sul e usar transporte público, até porque trem e metrô só eram opções quando ia a São Paulo. Porto é deficiente visual.
Um dia, ele passou mais de quarenta minutos no ponto – tempo suficiente para decidir pesquisar se os ônibus da sua cidade tinham sistema de rastreamento por GPS. “Eu fui atrás de informações como usuário, não como programador. Não me importava quem iria fazer o trabalho, me importa que tenha uma ferramenta acessível”, conta. Marcou uma reunião com a empresa concessionária de transportes e chegou à Cittati, que já estava desenvolvendo um aplicativo para os usuários de ônibus locais.
Assim surgiu o CittaMobi Acessibilidade, um aplicativo para deficientes visuais que busca atender às necessidades específicas de mobilidade urbana desse público. A primeira informação fornecida ao usuário, por exemplo, é uma lista com os pontos de ônibus da região, ordenados do mais próximo para o mais distante. Uma vez escolhido o ponto e a linha desejada, o aviso é dado dois minutos antes da chegada do veículo. Ao longo do trajeto, é indicado em que local do itinerário a pessoa se encontra, para que ela saiba qual o caminho feito pelo motorista. Ao final, é emitido um aviso sobre a aproximação do ponto de descida.
De início, o CittaMobi não avisava o ponto de descida, mas isso era prioridade para Luiz, pois era uma maneira de não ficar dependendo de um aviso do cobrador ou de ter que descer em um local desconhecido e ter que pegar outro ônibus, caso ele esquecesse. “Não era fã de ônibus quando morava em São Paulo. Para quem enxerga, descer no ponto errado é tranquilo. Para quem não enxerga, não conhece a avenida e não sabe onde fica o ponto, é diferente. Se o outro ponto for em outra rua, você fica completamente perdido. Hoje eu não odeio mais tanto quanto odiava antes”. O aplicativo atende passageiros de ônibus com deficiência visual em São Paulo e mais 32 cidades.
Além de desenvolver, Luiz testava cada versão do aplicativo logo que ela saía. Identificava os problemas, procurava soluções e trabalhava em uma atualização. Atualmente ele está pensando na possibilidade de auxiliar o usuário no deslocamento até o ponto de ônibus. A precisão do sistema de GPS dos celulares é um dos obstáculos para que essa funcionalidade seja incorporada. “Num mapa você nem percebe a diferença entre a localização real e a indicada, mas quando você lida com número é algo exato. A distância de 30 metros, se a orientação dada é seguir em frente, pode incluir a travessia de uma rua”.
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Os critérios para decidir qual o melhor caminho também é diferente para um deficiente visual, ele pode preferir andar distâncias maiores em uma rua que ele conhece e/ou tem uma calçada mais regular, que fazer um caminho indicado pelo aplicativo que pode incluir uma travessia perigosa em lugar desconhecido. Como programador, Luiz é avisado apenas sobre os problemas da ferramenta que precisam ser resolvidos. “Não tem um retorno sobre o que funciona. Esse é um trabalho que não acaba, sempre haverá coisas que quero implementar. Para algumas delas já tem tecnologia disponível e outras não tem ainda”.