O que é? Um site americano fez um desafio com seus leitores: fotografar as áreas de estacionamento em shoppings e lojas de departamento durante a Black Friday para mostrar a quantidade de espaço ocioso.
Cabe até corrida de Fórmula 1
Um deserto de concreto, com carros pelo meio do caminho. O lugar parece não levar a lugar algum, e às vezes até há placas orientando os desbravadores. O trajeto é árduo, muitas vezes dá vontade de desistir. Até que, ao fundo, lá no horizonte, pode se ver uma construção. Sim, ela está lá! É o shopping center que tanto se procurava.
Claro que há um exagero no relato acima, mas muitas vezes é essa a sensação de se caminhar pelo estacionamento de um shopping, outlet ou loja de departamentos nos Estados Unidos. A área comercial em si é ilhada por um gigantesco espaço reservado para os compradores, com estacionamentos tão grandes que parecem exagerados. E já há pessoas contestando o dimensionamento das garagens em torno do comércio.
LEIA MAIS: Black Friday é sinônimo de consumo, mas surgiu é do trânsito caótico
O site Strong Towns fez um desafio com seus leitores no último 27 de novembro. Era a Black Friday (dia de grandes promoções e um dos mais agitados do ano nas lojas americanas) e quem passasse por uma loja deveria tirar uma foto do estacionamento. O objetivo era ver se aquelas imensas áreas, teoricamente dimensionadas para atender ao movimento de pico, realmente eram aproveitadas.
O resultado foi o esperado pelos organizadores do #BlackFridayParkingDay. Vários estacionamentos tinham grandes áreas ociosas, ainda que, segundo os relatos de muitos dos colaboradores, o movimento até fosse bom dentro das lojas. Ou seja, não é necessário reservar tanto espaço assim para os carros.
O levantamento não tem valor científico, mas expõe uma questão importante. A cultura de enormes estacionamentos é tão grande que se perdeu a noção do que é realmente necessário. Alguns chegam a ter avenidas internas, com semáforos. Um grande exemplo do gigantismo desses espaços foi visto em 1981 e 82, quando montou-se uma pista dentro do estacionamento do Ceasar’s Palace, em Las Vegas. E não foi um espaço para crianças brincarem de bate-bate ou de kart, era um circuito de 3,65 km de extensão para a Fórmula 1 (foi lá que Nelson Piquet conquistou seu primeiro título, diga-se).
O estudo “Estrutura de estacionamento: energia, emissões e impacto ambiental do ciclo de vida do automóvel” trabalha em cima do custo ambiental de tantas garagens. Os pesquisadores elaboraram diversos métodos para estimar a quantidade de vagas de estacionamento existentes nos Estados Unidos. Um cenário médio chega em 840 milhões. Isso é mais que o dobro da população e mais que o triplo da frota de carros do país.
MAIS RUAS: Por que construir mais ruas não melhora o trânsito (pelo contrário)
Essa tradição cria problemas às cidades. O primeiro é econômico. O pequeno comerciante é obrigado a atender a quantidade de vagas previstas pelas leis municipais e pode ser prejudicado em duas vias: é obrigado a encontrar lotes maiores para sua loja, mesmo que não precisasse de tanto, ou deixa de ampliar seu espaço de venda para preservar o estacionamento.
O grande comerciante também sofre, mas de autoflagelo. Lojas como Target, Walmart, Kmart e Lowe’s têm suas próprias regras sobre estacionamento, normalmente incluindo padrões maiores que as das prefeituras. Ou seja, elas ficam com espaço ocioso por decisão própria.
A tendência das grandes cidades é aumentar o adensamento para reduzir distâncias e facilitar a estruturação de todo o sistema de mobilidade. Ter tanta área ociosa é nocivo, mesmo para as cidades americanas que queiram manter seu caráter pró-carro. Até porque, mesmo que o Boxing Day (26 de dezembro) tenha mais movimento que a Black Friday e chegue a lotar os estacionamentos das lojas, é contestável o quanto o movimento eventual de um dia valha o sacrifício de espaço dos outros 364 dias do ano.
VEJA MAIS: Los Angeles enfrenta seu caos – e pode ajudar São Paulo
Nos últimos anos, vários shoppings americanos estão em crise, sendo convertidos em espaço de escritórios. A concorrência com lojas online tem muito a ver com isso, mas só reforça o quanto as lojas físicas não podem se dar ao luxo de desperdiçar recursos. Para o bem delas próprias e da cidade em que estão.
SIGA A PÁGINA DO OUTRA CIDADE NO FACEBOOK