“As bicicletas estarão livres, leves e soltas ali.” É assim que Daniel Valença, da Associação Metropolitana dos Ciclistas do Grande Recife (Ameciclo), explica um projeto experimental de compartilhamento de bicicletas que a entidade está organizando nas comunidades de Caranguejo e Tabaiares. O Bota pra Rodar começou em fevereiro com uma campanha de doação para reunir as bikes que serão disponibilizadas em dois bicicletários que contarão com dez unidades cada e uma estação de reparos com ferramentas e bomba de encher pneu.
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A campanha de receptação de bicicletas ainda não acabou e quem quiser pode se cadastrar na página do projeto. Um modelo de carta explicando o “Bota pra Rodar” para ser entregue aos síndicos e cartazes para serem fixados nos elevadores também foram disponibilizados pela Ameciclo para estimular a doação das bicicletas esquecidas nos bicicletários dos prédios. As doações são recolhidas de triciclo ou bike depois de, em média, duas ou três semanas do cadastro. Oito bicicletas em regiões mais afastadas da sede da associação – em Setúbal, Curado, Abreu e Lima e Paulista – serão retiradas nas próximas semanas.
O projeto já reuniu 40 bicicletas, mas a campanha continua porque a associação deseja melhorar as unidades coletadas sem precisar comprar muitas peças. A ideia é fazer uma oficina de reparo com a comunidade e depois realizar em conjunto a recuperação das bicicletas doadas. “Em outras comunidades as pessoas já sabiam consertar, mas em uma ação de reparo das bicicletas dos moradores, descobrimos que as pessoas que moram lá não sabem como fazer. Por isso decidimos organizar uma oficina de reparo”, conta Daniel.
A Ameciclo se aproximou da comunidade de Caranguejo-Tabaiares com auxílio da ONG Fase, que já realizava um trabalho com jovens da região. “A gente percebeu que eles compartilham as bicicletas dentro de casa, é uma coisa que eles fazem naturalmente. Isso porque tem uma ou duas bicicletas em casa, não uma para cada morador. Eles já têm esse hábito”, conta Daniel. Segundo a pesquisa de percepção de uso feita pela associação 73% dos moradores participantes disseram que possuem bicicleta própria e 76,9% afirmaram que usariam mais o modal se fossem disponibilizadas unidades para compartilhamento na comunidade.
A iniciativa foi inspirada no “Plano da Bicicleta Branca”, uma ação do movimento holandês Provo, que disponibilizou bikes dessa cor para uso público em Amsterdã. A polícia chegou a apreender as bicicletas porque existia uma lei que proibia o “abandono” de bicicletas sem cadeado. Em sua primeira fase, cada um dos bicicletários contará com dez unidades para uso livre ou segundo termos determinados pela comunidade. “Eu imagino que, como vai ter caixote, o uso seja principalmente para carregar comida ou ir ao trabalho – um empréstimo de um dia, ou fazer compras e tentaremos estimular isso”, diz Daniel.
Se tudo der certo – ou seja, se as bicicletas não forem extraviadas – o experimento será considerado bem sucedido e mantido dessa forma. O plano B é disponibilizar as outras 20 bicicletas com cadeados e deixar que a senha seja distribuída na comunidade. “Em Amsterdã sabemos que durou um mês ou dois de uso”, conta Daniel. Depois de um ano, a pesquisa de percepção de uso será refeita para medir o impacto na comunidade. Outra métrica indireta que será usada pelos associados é encontrar as bicicletas rodando por Recife.