A situação do transporte público no Rio de Janeiro foi destaque na onda de incertezas sobre os serviços públicos de um estado que estima fechar o ano com um rombo de R$ 17,5 bilhões. Na última semana, um documento assinado pelo diretor executivo da RioCard, Carlos Silveira, comunicou que os usuários teriam de pagar os valores sem desconto da passagem porque o governo fluminense não estaria repassando o subsídio do bilhete único intermunicipal para as empresas que operam o serviço. O texto circulou até que a Secretaria Estadual de Transportes (Setrans) e representantes das concessionárias se reunissem e decidissem pela manutenção do programa.

Dentro das perspectivas nada animadoras para os serviços estaduais do Rio em 2017 e o contexto no qual as notícias falsas são vistas como um recurso que se aplica a um número cada vez maior de situações, a previsão com horário e data marcada para o fim do subsídio (0h do último dia 26) virou uma certeza tão rápido quanto foi completamente esvaziada. A publicação do documento sinaliza uma manobra das empresas a fim de garantir o pagamento em tempos nos quais o estado se consolida como um mau pagador, mas a veracidade do documento chegou a ser comprovada e não se tratava, afinal, de notícia falsa.

Pressionado, o governo – que deve aproximadamente R$ 6 milhões às concessionárias de transporte – anunciou no sábado que suspenderia integralmente o subsídio e regularizaria os devidos pagamentos ao longo dessa semana. No entanto, a proposta apresentada pelo governo à Assembleia Legislativa (Alerj) para “readequar o programa à nova realidade financeira do estado” prevê que, a partir do ano que vem, o usuário passará a desembolsar R$ 7,50, R$ 1 a mais que hoje.

Na prática, dos cinco milhões de pessoas que estão cadastradas no programa, 1,5 milhões não recebem vale-transporte e teriam que pagar do próprio bolso a diferença. O pacote de cortes de gastos do governo estadual do ano que vem também inclui o estabelecimento de um teto para o subsídio de R$ 150 por mês por usuário. Atualmente, a Setrans informa que 96% dos usuários consomem menos que esse valor de subsídio mensalmente. A secretaria não informou como ficaria essa proporção caso o reajuste da tarifa para R$ 7,50 seja efetuado. Quem utiliza a integração entre BRT e metrô, por exemplo, já desembolsa R$ 7 usando o bilhete.

O subsídio – pagamento da diferença entre o valor operado com o bilhete único e a tarifa cheia das passagens – corresponde a R$ 500 milhões por ano e seria cortado para R$ 244 milhões caso as duas propostas apresentadas para a Alerj – o teto e o aumento da tarifa para o usuário – sejam aprovadas. A economia resultante dos cortes representa 1,46% do valor do rombo das contas do Rio de Janeiro em 2016.

Na região metropolitana, o sistema intermunicipal de transporte por ônibus é responsável por de mais de 80% da movimentação de passageiros. Ventilar a questão subtraindo o número de passageiros que usam vale-transporte e que não atingem o teto de subsídio por usuário proposto no pacote de contenção de gastos ainda está longe de arejar a questão tanto quanto contabilizar a parcela da dívida total que a economia feita com os cortes no bilhete cobriria. E isso diz bastante sobre as concessionárias e alguma coisa sobre governos, mas muito pouco sobre quem realmente sofrerá com os cortes.