O que é? O carnaval de São Paulo começou com cordões que tradicionalmente desfilavam em seus bairros de origem, deu um pulo na avenida Tiradentes e outro na São João. Passou pela ocupação irrestrita do espaço público e também pela separação entre as pessoas que participam das que assistem. Apesar disso, os blocos continuaram saindo às ruas, mesmo quando a rigidez da regulamentação exigida quase barrou a folia.

São Paulo de outros carnavais

Depois de anos fora do roteiro do carnaval, na semana passada a avenida Tiradentes voltou a receber os foliões antes mesmo do carnaval chegar. A via foi abrigou os desfiles das escolas de samba, até inauguração do Anhembi em 1991. Os blocos que passaram por lá no último fim de semana foram proibidos de desfilar no Campo de Marte, de onde costumavam sair, justamente para não atrapalhar os últimos ensaios e transferências de carros alegóricos para o Sambódromo.

O carnaval da avenida Tiradentes era inicialmente gratuito, mas o local passou a ser restrito aos pagantes que tinham acesso à arquibancada móvel um ano depois do local virar sede dos desfiles, em 1978. Até então, a o local oficial do carnaval organizado pela prefeitura era a avenida São João, ainda que os cordões  tradicionalmente desfilassem em seu próprio bairro de origem. No centro também ocorriam os concursos com os cordões percorrendo um circuito, sendo que o trajeto mais tradicional, segundo o historiador Bruno Sanches Baronetti, da USP, era o que passava pela região da Rua Direita, XV de Novembro e Praça da Sé.

O primeiro cordão surgiu na Barra Funda no início do século XX e o ultimo desfile ocorreu em 1971, quando duas das três agremiações que existiam – a Vai-Vai e a Camisa Verde e Branco –  se organizaram em escolas de samba. A mudança se deu pouco depois que a prefeitura passou a patrocinar o carnaval, adotando o regulamento carnavalesco do Rio de Janeiro e tornando os cordões esteticamente mais próximos do que são hoje as escolas de samba.

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A primeira escola de samba paulistana foi fundada na Liberdade, em 1937, mas com a inauguração de um lugar específico para a realização de desfiles na zona norte, a região passou a concentrar a maioria das agremiações no entorno do Parque Anhembi. O processo acelerado de urbanização da cidade também contribuiu para a dispersão da folia do centro para outras áreas da cidade. A Barra Funda, o Vale do Anhangabaú e a Liberdade foram perdendo espaço a medida que a extensão do rio Tietê ia agrupando mais agremiações nos bairros de Vila Maria, Freguesia do Ó, Santana e Casa Verde.

Na zona norte, a Vila Esperança organizava seus festejos de carnaval paralelos aos desfiles oficiais desde 1932. Algumas agremiações tradicionais como a Nenê de Vila Matilde, R.U.V.E. e Sociedade Amigos de Vila Matilde começaram desfilando nas ruas do bairro. Esta última teve um papel importante no desenvolvimento do bairro, reivindicando a instalação da primeira linha de ônibus local e melhorias na infraestrutura da região.

Aos poucos, foram surgindo os blocos como os conhecemos hoje – espontâneos e irreverentes, sem cordas, grades ou abadá. O Esfarrapado, do Bixiga, desfila desde 1947, sempre na segunda-feira de carnaval. A escola Mocidade Alegre, por sua vez, começou sua história no Bom Retiro com um grupo de homens que começaram a sair pelas ruas vestidos de mulher em 1950, inicialmente era chamado de Bloco das Mariposas. Outras agremiações, como a Acadêmicos do Tucuruvi, fizeram o caminho inverso, criando um bloco para juntar amigos e moradores da região que não possuem recursos para participar do carnaval no Anhembi.

A ideia de criar o bloco surgiu nos últimos anos, depois que os blocos voltaram a ganhar volume novamente na capital paulista. Isso porque em 2012 o carnaval de rua foi esvaziado, pois muitos blocos não conseguiram aval da prefeitura para desfilar ou tiveram problemas para obter autorização. O Acadêmicos do Baixo Augusta chegou a celebrar a festa em um estacionamento depois de ser proibido pela CET de ocupar a via.

Alguns blocos já festejaram por vários cantos da cidade, como o Grande Família, que foi fundado em 1982 e começou desfilando na região do Itaim Bibi e Vila Olímpia. O grupo desfilou alguns anos pelas ruas da Vila Madalena, depois foi para o Tatuapé e então para o Brooklin. Depois de pular na Engenheiro Caetano Álvares em 2012, esse ano a concentração foi na Avenida Moema.

Se em 2013 foram aproximadamente 40 os blocos que saíram para a folia na cidade, em 2014, o número pulou para 210 e chegou na casa dos 300, em 2015. Depois das dificuldades que enfrentaram para sair em 2012, 24 blocos assinaram o Manifesto Carnavalista no ano seguinte, reivindicando que o poder público oferecesse condições para que o carnaval de rua pudesse acontecer. Em 2014, quando o número blocos mais que triplicou, foi promulgado um decreto municipal para regular o carnaval, que basicamente prevê a presença de ambulâncias, banheiros químicos e limpeza, além de programar as intervenções necessárias no trânsito. Isso não eliminou os conflitos entre o poder público e os foliões (como é possível ver aqui, aqui e aqui), mas reforçou a ideia de que a rua também é lugar de festejar o carnaval em celebrações públicas e abertas.