Barcelona e Sevilla entrarão em campo, neste domingo (22), para disputar a final da Copa do Rei. Já imaginando que a torcida barcelonista aproveitaria a ocasião – que normalmente tem um representante da família real espanhola nas tribunas – para manifestar o desejo por independência da Catalunha, as autoridades proibiram a presença de bandeiras catalãs nas arquibancadas. Houve muita discussão e protestos, e, no final, a Justiça determinou que os torcedores tinham o direito de defender a separação de sua região. Foi mais um capítulo de uma disputa que tem sido cada vez mais acirrada, e que já atinge até pequenos comerciantes.
A crise econômica que atingiu a Espanha nos últimos anos aumentou o desejo de independência por parte dos catalães. O separatismo, uma ideia que tradicionalmente tem força na Catalunha, ganhou mais adesão após Madri aumentar impostos na rica região, usando esses recursos para equilibrar as contas de áreas menos desenvolvidas do país. A isso se somaram outras medidas para limitar o aumento de autonomia, que provocaram reação mais intensa da Generalitat, a administração regional. O caso mais evidente desse clima de animosidade foi a realização de um plebiscito pela independência à revelia do governo nacional.
LEIA MAIS: Como símbolo de protesto, torcida do Barcelona exibirá bandeiras da Escócia na Copa do Rei
No meio desse processo, a Catalunha tem reforçado as políticas de identidade local. Uma delas é a obrigação dos comerciantes de terem informações públicas (cardápios, faixas, cartazes, avisos de promoção, catálogos, letreiro na fachada) em catalão. Quem não seguir a determinação tem de pagar multa. A lei existe há mais de uma década, mas nunca foi fiscalizada com força porque provoca muita polêmica, mesmo entre os locais.
Desde 1979, o espanhol e o catalão são reconhecidos como idiomas oficiais da região. Pela lei federal, as duas têm o mesmo status e, portanto, não se pode impor uma língua sobre a outra. Isso colocaria as multas linguísticas como uma medida ilegal, pois dá ao idioma regional uma força maior que ao nacional. Afinal, não há previsão de punição caso uma loja faça o contrário e só anuncie seus produtos em catalão, ignorando o espanhol. No entanto, o governo da Catalunha – comandado pelo nacionalista Carles Puidgemont – tem ignorado esse fato e segue reforçando suas políticas. Em 2015, a arrecadação com as multas linguisticas foi 174% maior que no ano anterior, ritmo que segue aumentando nos primeiros meses de 2016.
A lei afeta diretamente o pequeno comerciante. A reforma de toda a linguagem visual de seu estabelecimento representa um investimento alto dentro de sua realidade financeira. Por isso, muitos têm preferido continuar pagando as multas, pois ainda sairia mais barato. Uma reportagem da The Economist apresentou o caso do dono de uma loja de móveis, que terá de pagar € 1.260 em multas linguísticas, mas seria obrigado a gastar € 18 mil para adequar seu comércio.
VEJA TAMBÉM:
– Barcelona cria superquarteirões para ter mais área para pedestres
– Por que prefeita de Barcelona vetou evento sobre cidades inteligentes
Lojistas e lideranças políticas mais liberais têm contestado essa política. Além dos aspectos legais, ela até ignora uma questão prática: o idioma mais falado da região é o espanhol. Em 2013, uma pesquisa realizada pela própria Generalitat apontou que 55,1% dos moradores da Catalunha indicam o espanhol como sua primeira língua e 50,7% como a mais usada no dia a dia. O catalão fica com 31 e 36,3%. Na Grande Barcelona, onde há mais moradores nascidos em outras regiões e de turistas, o espanhol é a língua mais usada no dia a dia por 60% das pessoas.
A obrigatoriedade do catalão é colocada como forma de manter o idioma vivo e impedir que ele seja engolido pelo espanhol. Mas, com as multas linguísticas, acaba criando pressão econômica e política justamente sobre um elemento frágil em um país que vive crise: o pequeno comerciante. Ainda mais em uma cidade que recebe tantos turistas e que tem feito políticas urbanas para priorizar a mobilidade ativa e a melhoria e os calçadões.